Testamento que Chica da Silva escreveu no Mosteiro de Macaúbas é preciosidade

Testamento que Chica da Silva escreveu no Mosteiro de Macaúbas é preciosidade
História da mineira que viveu no século 18 surge por inteiro em documentário com muitas revelações. Carta de alforria e testamento se encontram em Belo Horizonte, sob guarda do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Foto: Quinho

Gustavo Werneck

Estado de Minas

Ela já foi tema de filme, novela de televisão, música de sucesso e enredo de escola de samba. Agora, mais de 200 anos após sua morte, a lendária Chica da Silva, batizada, em 1734, Francisca da Silva de Oliveira, tem sua vida revelada sem clichês, fantasias e excessos da ficção. No documentário “Chica da Silva – A Descoberta do Testamento”, produção original do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, disponível no canal do TJMG no YouTube, a mineira ganha as luzes da pesquisa para trazer, ao público do século 21, informações sobre uma trajetória extraordinária, desconhecida, surpreendente.

O testamento de Francisca da Silva de Oliveira, falecida em 1796, foi encontrado no fórum da comarca do Serro, estando sob a guarda do TJMG, no Museu da Memória do Judiciário (Mejud), em BH. Nesse acervo, se encontra também a carta de alforria dela, restaurada e encadernada. No caso específico do testamento, ainda não ocorreu a restauração – está em processo de aquisição, pelo TJMG, um equipamento para ser usado nesse serviço.

Análise do Laboratório de Conservação e Restauração do Mejud revela um testamento extremamente fragilizado, com a recomendação de que não seja movimentado, pois há riscos a sua integridade. O documento apresenta danos causados pelo ataque de insetos xilófagos, os quais consomem a celulose e causam lacunas, deixando as páginas perfuradas. A situação precária se completa com as folhas amareladas, devido ao processo natural de acidificação, e papel quebradiço, em decorrência do manuseio.

Verdadeira imagem

O documentário vai muito além da imagem fantasiosa construída ao longo de décadas, para contar, com profundidade, desde as origens da mulher negra, nascida em Milho Verde, no Serro, e escravizada no século18, até a ascensão social por meio da união com o contratador de diamantes, João Fernandes de Oliveira, um dos homens mais ricos e influentes do império português. O casal teve 13 filhos. Dessa forma, tem-se uma nova perspectiva sobre a mulher que marcou seu tempo, e, em sua essência, era conhecida apenas por historiadores, pesquisadores e especialistas no assunto.

Em material de divulgação, o TJMG informa que o trabalho “aborda a descoberta do testamento, ajudando a desmitificar narrativas não condizentes com a realidade”.

Como um dos momentos importantes do documentário, há a revelação de que Chica da Silva, que morava com João Fernandes no antigo Arraial do Tijuco ou Tejuco, atual Diamantina, escreveu seu testamento, em 1770, no tricentenário Mosteiro Nossa Senhora da Conceição de Macaúbas, em Santa Luzia, na Grande BH.

Na época, a imponente construção era um recolhimento para mulheres e também escola, na qual estudaram as filhas do casal – e ela sempre visitava as meninas. João Fernandes mandou construiu uma parte importante do recolhimento, conhecido como Ala do Serro. A casa, ao lado do mosteiro, onde Chica da Silva ficava hospedada está bem conservada.

E mais: “Há depoimentos de descendentes e documentos, como a carta de alforria e o próprio testamento, além de imagens das cidades mineiras pelas quais Chica da Silva passou. ‘Chica da Silva – A Descoberta do Testamento’ é um passeio de 50 minutos pela vida de uma mulher escravizada, que enfrentou o racismo e o machismo para se impor na sociedade conservadora da época”. No ar, também há um hotsite (tjmg.jus.br) com reportagens especiais sobre a lendária personagem.

O Museu da Memória do Judiciário (Mejud) fica na Avenida Afonso Pena, 1.420, no Centro de BH, mas, por estar em obra, a visitação está suspensa, sem data para reabertura.

Assista ao documentário completo:

 

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