Luzias

Uma vez mais, a Secretaria Municipal de Cultura adiou a votação do projeto Cidade Jardim, megaloteamento que a construtora Emccamp planeja fazer na antiga fazenda de Vicente de Araújo, às margens do Rio das Velhas. Foi marcada uma nova reunião para o próximo dia 12 de setembro, quinta-feira, às 9h, no Teatro Municipal Antônio Roberto de Almeida. Será a sexta para discutir o projeto. Mas ninguém sabe se haverá nova protelação.

A reunião do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural, Compac, de quinta-feira(08) foi dedicada a, finalmente, ouvir os argumentos dos moradores que se opõem ao empreendimento, pois, se levado adiante, terá um impacto desastroso nos bairros da parte baixa de Santa Luzia. É esse Conselho, constituído de 14 integrantes, que vai decidir a sorte do projeto da Emccamp.

Cadê os conselheiros e a Emccamp?

Para espanto dos moradores que ocuparam as cadeiras do Teatro Municipal, onde a reunião foi realizada, exatamente no dia em que quem vive na cidade ia se manifestar sobre o megaloteamento, apenas seis conselheiros compareceram. A Emccamp, que costuma fazer tanto barulho com seu batalhão de funcionários, mandou apenas discretos gatos pingados.E a Secretária de Desenvolvimento Urbano, Andrea Vacchiano, sempre tão ativa na defesa do projeto, por que não compareceu? Todos mostraram claramente que não estão interessados em saber o que pensam os moradores, aqueles que sofrerão as consequências da implantação de qualquer proposta imobiliária naquela área.

Desde 2019 que uma parcela da população de Santa Luzia, principalmente residentes dos bairros ribeirinhos, luta contra a transformação da única área verde na área central da cidade em um bairro, com 538 lotes, entre particulares e comerciais. O que os moradores sonham é ver a antiga fazenda, que já foi uma das mais prósperas de Minas, transformada no Parque Natural Municipal Vicente de Araújo, em homenagem ao antigo proprietário, um homem conhecido pela generosidade e pela maneira amável de tratar os luzienses.

A antiga fazenda de Vicente de Araújo fica ao lado desse trecho do sofrido, sempre desrespeitado, Rio das Velhas. Foto: Luzias

Prefeitura e vereadores a favor do megaloteamento

O projeto imobiliário tem o apoio de praticamente todos os vereadores – uma das exceções é Glayson Johnny -, e da Prefeitura, que não vem poupando esforços para garantir a sua aprovação no Compac. O Conselho é o último órgão a deliberar sobre o Cidade Jardim. Se os conselheiros derem o sinal verde, o projeto estará aprovado. Como os que lutam contra não têm dado trégua, comparecendo sistematicamente a todas as reuniões, o secretário da Cultura, o gaúcho Cassiano Luis Boldori, naturalmente alinhado com a posição da Prefeitura, tem usado todo tipo de artifício para impedir que a oposição ao projeto prevaleça.

Vários moradores de Santa Luzia se manifestaram diante da plateia de moradores, fazendo um apelo ao Compac para que os conselheiros votem contra o megaloteamento. Todos os que falaram expressaram indignação com as manobras que vêm sendo feitas para que o projeto Cidade Jardim seja aprovado. Uma das falas mais importantes foi a do Professor João Bosco Giovannini, porque ele, um dos que mais lutam por Santa Luzia, mostrou que até uma lei absurda foi criada pela atual administração para facilitar a aprovação do empreendimento imobiliário.

Banqueiro Vicente de Araújo. Foto: Reprodução/Internet

Lei feita para facilitar aprovação

“Vou me ater especificamente à Lei 4716, de 24 de abril de 2024. Ao contrário do que afirmaram o representante da Emccamp e a Secretária de Desenvolvimento Urbano, não tenho dúvida de que esta lei, aprovada pela Câmara e sancionada pelo Executivo em tão curto espaço de tempo, tem sim, tudo a ver com o empreendimento Cidade Jardim,” denunciou o professor, continuando:

“Era o caso, pela gravidade da situação, para uma audiência pública. Sei que o processo para aprovação de uma lei nunca foi tão rápido assim, uma vez que, como cidadão, sempre participei das reuniões da Câmara, acompanhando o andamento das sessões. Por várias vezes me utilizei da tribuna do povo para fazer pronunciamentos de interesse da comunidade luziense.

Não é mera coincidência que esta lei tenha sido sancionada no dia 24 de abril deste ano. Como não associá-la ao empreendimento? Qual seria o motivo para sua aprovação, justamente agora? Por que submeter tantas pessoas a sérios riscos, agora não mais só de danos materiais, como também risco de vidas? Não somos tolos. Seria ela uma lei, ou uma sentença?” Perguntou ele.

Por via das dúvidas, prefeito se protege

Ao fazer, diante dos conselheiros e do público presente à reunião, uma análise detalhada dos artigos da mencionada lei, explicou João Bosco, “ficou muito claro, para mim e para os presentes, seu objetivo, ou seja, permitir que a Emccamp se utilize do local, uma área de risco, para a implantação do empreendimento Cidade Jardim.

Ao final do texto da lei, no parágrafo único do artigo 13, o prefeito se exime oficialmente de qualquer responsabilidade, para espanto de todos. Eis, na íntegra, o teor do parágrafo: “A concessão de licenças, alvarás ou autorizações no âmbito do parcelamento do solo e construção de edificações não acarreta responsabilidade ao Executivo por qualquer sinistro ou acidente decorrente da ocupação de área suscetível a inundações.”

Esta é a área, única na área central de Santa Luzia, que querem destruir para construir casas. As imagens são de Ramon Damásio, do Virou Notícia:

O que chama muito a atenção é que o próprio prefeito admite na lei os riscos decorrentes de sua aplicação e simplesmente a sanciona, tirando de si qualquer responsabilidade por eventuais acidentes. Ou seja, se algo acontecer, o grande responsável estará protegido por lei.

É preciso dizer mais alguma coisa?